João José Gomes Martins nasceu em Juazeiro (BA). Formado em Letras (UFPA).
ao vencer o I Concurso de Poesia "Professor (a) Poeta ", organizado pela Prefeitura de Marabá /Secretaria de Educação /Casa do Professor , com o poema "O Papel ".
Os poemas , a seguir , integram a coletânea inédita “A marcha da canção funérea ”.
O papel
E como a nuvem carregada que ao ferir-se no raio
[verte água , lágrima e suor conservado
Devo sangrar-me com a palavra que abre a luz e clareia o véu .
E como rimam as palavras em contentamento ,
Cobiço em versos , secar as lágrimas do meu inocente desalento .
[ilusoriamente, a sábia Sofia.
A obrigação é mesmo o degredo das almas
E nunca imprima o castigo silencioso e vazio .
O medo fugaz silencia unicamente os sussurros de pavor .
Libertai-nos! Libertando-os de tanto e cruel terror .
Avie atitude no labor fervente e inquietante de todo dia
E jamais se espreite na proteção da intolerância arbitrária e fria .
Exculpam em pedra bruta , flores de matiz colorado.
Versejem atos e fatos de amor no outro amado ao lado .
Calculem matemáticas nas curvas das estradas
[e no vão distante dos caminhos .
Avaliem igualmente a média aritmética ponderada dos espinhos .
Faça arte em vidas que , às vezes , são pequenos pedaços .
Registrem lições de paz para os sem pães , sem Camões,
De mentes envolvidas em mormaços e em sermões .
Faça ciência na poeira da soleira .
No barro oco arranje escultura ,
E o resto , só o esclarecimento definirá
O destino em construção
Percorria veredas de contradição ,
Queria o prazer imediato e sentia em si latente ,
O desejo do viver inconseqüente .
O que lhe ia dentro era ave corvídea, águia rapinante , carcará do sertão ,
E na altura da soberba despia-se deveras de toda compreensão .
De que sobre os ombros suportaria desmedida opressão .
Insculpida nas linhas que lhe cruzavam a palma da mão .
As misteriosas linhas previam que vida longa ia alcançar ,
Os traços cruéis sugeriam estar o cabra moldado por cruz própria ,
A ser um Ser por predição condenado a viver na mais pura inópia,
O mistério era o porvir que vivia a arremedar ,
E em arrimo improvisava paródia para sua missão arrebatar .
Do mesmo modo que não sabia se deveria em sortilégios confiar ,
A sua ditada sentença nas curvas do desatino por certo ia esgarçar .
O insano infiel sem arreio e sem firmamento ,
Ardia-se com a maldita desdita cruel do julgamento .
A argúcia então lhe inferia que sem teoria ,
Proferindo apelos aos santos sem qualquer distinção ,
Alcançou apenas o senão , a lástima e a amolação.
Deixar-se-ia enfim abrigar em si a torpe sina ,
E inferindo abarcar enfim a estouvada ocasião ,
Desprezou com alarme os rogos de sua obscura razão .
Pensou ir longe sem engano a sua imaginação ligeira ,
Esvoaçando alto o céu como se fosse a ave condoreira.
Cantou sonhos e cantorias em viola seresteira.
Libou vinho , saudou santo , pulou brasa de fogueira .
Contou causos e histórias de cordel de repentista de feira ,
Improvisou da rima como se a alta estima fosse sua parceira .
Amou grácil flor menina intata , graciosa e faceira ,
Seduziu dona séria se deleitou com a bela rameira .
Tecia na rima a mulher como árvore frondosa ,
É bicho malvado que carrega segredo e desilusão.
É flor que machuca sem doer , mel que amarga o coração .
É passo dado apressado pra se perder de aflição .
Moveu-se outra vez , talvez , pelo insulto da alucinação .
Esquecendo-se de repente das amarras da tribulação ,
Deu forma em seu pensamento a uma tênue decisão .
Bradou pra si mesmo que seguiria agora a sua remota aspiração ,
E zunindo feito tonto besouro , sozinho feito um demente touro
Nas matas do Xingu se embrenhou a procura do fulgor do ouro .
Fumando cigarro de palha , cortando a ferro e facão .
Quis arrancar do flúmen à pedra brilhante que em delírio via .
Escavando com animosidade um abismo no inculto chão ,
Enfeitiçou-se e enlouqueceu na argúcia que o iludia.
Sentindo, um dia , largo lampejo acender-lhe a visão ,
O desdenho que ecoou fez-lhe entender a questão :
O sopro nas ventas dera-lhe a divina providência ,
Sentiu o escuro manto invadir-lhe o coração .
Deplorando como alma penitente em aflição ,
Viu a existência vil conspirar e vexar o cidadão .
Humilhado, inapto , inerme e lento ,
O homem se sentiu preso à maldição .
Acuou-se por urros na pesada situação .
Ah! Homem de nome e pensamento ,
Se calculasses a exaustão que ele sentira nesse momento ,
Imploraria pra que se esse fado fosse apenas fingimento
E que o esconjurasse exigiria desse inumano sofrimento.
-Sabei vós , por acaso , oh , Deus !,
Às vezes , carrega tão severa maldição ?
-Se possuísse esse torpe a agudeza do agir
Dar-lhe-ia eu mesmo , asas para afastar-se
Do caído abismo em que quer sumir .
E assim além dos quintos do inferno sentisse
Se agora esse cabra da peste expirasse por efeito
Uma cruz no seu peito com fidúcia o encerraria.
Num frígido ataúde o sujeito ambíguo sepultaria
E o filho da outra que o dia fatídico anunciou
No barro frio um epitáfio nuvioso anotou:
“Andou sem causa e sem brio esse que aqui jaz.”
Seria ele filho de Deus ou filho do contumaz ?
Relata o cordel encantado que eu leio
E sem remissão , clemência ou rodeio
Diz que o Ente tornou à merda de que veio .
Poemação
Travas quem não te bebe!
Amargas, pois quem não te come.
Destila então teu acre veneno !
Condenas, pois teu podre poder !
Oprima com o teu eco viril , vil , servil .
Omita a luz , a vida !
E desvende os cruéis pesadelos que o escuro reluz.
De uma raça que dá ramas aos frutos que engendra da lama .
Veja! O espírito criador à espreita espia !
A tétrica macabra sorte
De escrever versos da alma nessa lápide fria .
Arde, verdade , realidade .
Executa então que a fonte escuta !
O brado que não é vago e tonto .
A voz sem culpa julga-se pronta .
Traduza enfim o rigor do funesto diário ,
Se o homem se tornar libertário .
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