Páginas

sábado, 16 de julho de 2011

Cores

Ademir Braz


 photo credit: Piotr Zurek
Em junho as noites são frescas e doces. Os bares põem cadeiras aolongo do cais, e ao embalo das águas passa-se o tempoToca às vezesmúsica dos anos sessenta e ouço a brisa em minha pele ressequidapor antigos verões
Na outra margem, a praia é um corpo de mulher esparramado ao luar.
praia!... Do alto da montanha que abriga a igreja de Nossa Senhorada Penhameu coração incontrolável arremessou-se aos ventos e espatifou-se para sempre nas areias da capixaba Vila Velha
(De Alagoas, não faloSob o céu alagoano respira uma pequena sereia de olhos claros e ferro nos dentes que faz programas com marujos e bucaneiros enquanto sonha com um cavaleiro encantado que virá, entre fadas, arrebatá-la num corcel alado).
luz do verãopara mimanimal notívago, recorda crises de sinusite. Doem-me a fronte e as têmporas, dói o respirar, é difícil conciliar comsol a ternura da cerveja repousada entre espumasUm diaumamigo ensinou-me um remédio caseiroeu deveria, disse elecortarem 4 partes uma buchinha, depois em outras 4 porções e, por fim,colocar uma dessas divisões mínimas de molho durante um dia em 20 mililitros de água destilada. Segui à risca o conselhoDepois bebi, envenenei-me, morri. 
Não era de beberera para botar uma gota duas vezes por dia nonariz.
Todas as praias são bonitas, suponho. Do Nordeste conheço poucas - uma ou duas de Fortaleza, uma de São Luiz - e algumas, no Paráquesequer constam dos mapas turísticos. Ilha de Romana é uma dessas,até onde sei. Para alcançá-la, tive de adular quase uma semana os pescadores artesanais que partem da corrutela chamada "Abade", próxima às espantosas ruínas de Curuçá, e que me largaram em pleno mardistante da praia, a pretexto de que era raso e não havia porto nem como o barco chegar mais perto da terra firme.
Caminhei mais de um quilômetro no marcom a água pela cintura,mochila às costas, a companheira travada de pavorEntão o paraíso desabou diante dos meus olhos: uma prancha de areias finas como saligualmente brancas, 16 pessoas vivendo entre "currais de peixe", muito sol e uma solidão luminosa sob a qual se passa e repassa o sentido da vida e de repente nada existe além da cumplicidade eleitaentre o olhar e a presença áspera do mar.
Recordo que fiquei um mês longe de rádiostevêsjornais, vendo a luzdar ao mar nuanças do verde-safira ao róseo-açafrão, cores que tive de nomear assim mesmo para melhor retê-las no fundo dos olhos e do coração. Lembro de um único livro que andava comigoentãoentre pães ressequidos, aguardentecharqueaçúcar e saquinhos de café: uma coletânea dos ensinos de Rajnheeshi sobre o amor sem fronteiras sem normas e da necessidade de perceber-se que viver é o ato que se renova permanentemente, a cada instante.

Nenhum comentário: