Havia um tempo de bambuzais azuis e montanhas brancas em que tesouras de inox afiadas modelavam a bruta parte da existência . A costura fantasiava a pele de uma época minguada de cores . As lâminas verdes de folhas cegas ditavam a primavera , quando tardia . Só o inverno afiava farpas , pontas , agulhas , gravetos , o inverno feria de abandono o encantamento que era tão bom como a quase tristeza . A hostil beleza da seca azulava os olhos das serras . Mas nada era tão violento como o silêncio e as perspectivas dos sonhos . No verde abrupto , quando chovia, como a antevéspera da culpa , explodia o germinar tão verde que era quase pecado . A beleza dos cios exauria-se do sexo da terra . O futuro era ânsia . Agora , aqui , há o tempo conciliado. Faça dele o que quiser, a liberdade inunda a imutabilidade de qualquer ação . Os motivos se foram, e a terra calçou-se de asfalto e já quero multidões para o amparo de minha solidão . Os insanos estão certos , é preciso morrer de paixão e rápido , antes do tédio , que o amor também é mortal . ( Marabá – 05-08-10/18-02-2011)
A aurora turva de fumaça a dúvida que não só de horizonte se preenche, mas da digital escolha e da entrega . As únicas verdades provisórias ficaram condenadas no instante e lograram o ímpeto de serem breves . Ou talvez não inexistiram como não existiu aquele menino que colecionava o fruto do juá , que fazia bezerros de barro , que perseguia o coito das coisas que tudo adoece de esperança . Só bem depois viria a saber como os deuses eram frágeis. Só as águas eram fortes , ainda hoje lá estão, correndo sempre , conjurando as metáforas da existência por que lá estarão de princípio porque estiveram depois do fim . A aurora de agora clama aquele que é e que nunca se libertará de si . (Marabá - 2010/2011)
E daí?
O veraneio vai espichando os horizontes cinzas . Dos meses meeiros de estio um Itacaiúnas magro de costelas de pedras expostas vai correndo milenar sob as sais da lavadeira . Pássaros suburbanos cagam na face das pedras . Do lado do verão sobre o verde do rio há um escuro e branco de precipitação. A tarde não sorveu o pó do chão nem subtraiu a fumaça sob as pontas finas de luz e corredeiras das horas . Tudo subtrai o sol e o cansaço no divagar da exausta segunda-feira . Contudo , vem a noite com seus dedos de oficina . Na água do chuveiro lava-se o suor de mais um dia . (Marabá – verão 2008, 2010, 2011)
Se não fossem tantos os silêncios pensados
Queria te dizer que flores floriram e que frutas grávidas breve visitarão o sol , amoras precipitaram-se maduras de desejo ante o beijo tênue dos pássaros . Mas isso tudo é frágil de sentido ante as urgências da casa , e de sua ausência . Enquanto e quando vagueiam dores e indecisões na vastidão do lar eu suborno horas . De que adiantam solilóquios , garantias . De que adianta antecipar o tempo , comprimindo-o, de que adianta adiantar e agendar débitos se os musgos nascem de nossos silêncios e inauguram mais invernos . Ao menos partimos em outra flora , mas dói não nascer onde nos plantamos... é um tempo onde os cultivares do coração estão estranhos e nascendo assim aos milhares , como se transgênicos fossem os sentimentos , se reproduzem em escalas , mas sem a graça germinal das esperas . ((Marabá - 11/03/10 – 01/02/2011)
E se...
tirarmos os sentidos das palavras , suor e mais ardor das palavras , mais amargos delas, como elas são ? Olhar dizer severo atrás do fino riso e beijo dizer nojo que limpa a saliva doce . E pai dizer aquilo interdito nas linhas do tapa que nunca pára de acabar sem encontrar o rosto , que dói nunca chegar a bater . E mãe dizer a dúvida de acalento em mornidão de repulsa . E a flor dizer mudez de cheiro em morte assim como coisa arrancada do talo . Para nunca mais alguém achar que deus é cor ou estadia de fraquezas últimas. E se a amnésia só se lembrar do desejo . E a luz não enxergar o cheiro da noite que convida a nada , porque há escuro onde realmente pode se ver , ou pelo menos olhar reverberado ao olho de quem olha . E isso não é fácil . Todavia , a despeito disso se você não sabe ser , está no caminho certo de encontrar o caminho ainda que não haja estrada alguma. Não que não haja limites para ... mas aprender como perdoar a existência pelo que é determinada por esta massa de tempo é difícil , ainda que não seja razoável .
(Marabá – Inhapim – Rio das Ostras – Belém – Marabá - 2010-2011)
Os peitos de Marília acalentariam o mundo com sua luz e néctar branco . É uma maciez e bico em luz de apaziguar a boca e a luta em cor de espuma . Os peitos de Marília podem amainar qualquer sede e voracidade em maternal aconchego . Nos peitos de Marília circunscrevo tesão , medo , sevícia e gozo . Peitos para se mamar o lado oculto de todo leite escuro negado ao desejo . No peito de Marília leite e mel condensam pecado ao ato mais puro de desejo de mamar . Mas não é leite que se nutre dos peitos de Marília, nem maternal desejo , senão a morte que nos casa ao desejo de não tê-los só meus ... (Marabá – 11/2010)
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