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segunda-feira, 25 de abril de 2011

Antônio Maranhão

Quaradouro, 25.06.2007
Antônio Maranhão nasceu em Imperatriz (MA) em 30.10.1921, e ainda jovem migrou para o sudeste do Pará, onde meteu-se por 25 anos nas frentes pioneiras do negócio de castanha-do-pará, jornada em serviço público e alguma atividade política, comunista confesso que era e, mais ainda, humanista radical, inconformado com a brutal exploração do trabalhador no extrativismo, no transporte fluvial da produção, uma e outra atividade onde se perdia a vida como quem vai ao bar tomar uma aguardente. Sua opção política valeu-lhe prisão e tortura no regime militar.
Apesar da faina dura, sem trégua, sem direitos trabalhistas ou humanoscircunstâncias que marcaram o labor durante todo o século XX nesta banda esquecida do mundo, Maranhão ainda reservou um tempo para transformar em verso seus protesto contra as desgraças que vivenciou (e que permanecem até hoje , nos registros modernos da imprensa ou nos arquivos da Justiça comum e do Trabalho).
Parte desses poemas foi juntada por amigos e publicada em Conceição do Araguaia em dezembro de 1996 sob o títuloBatismo sem sal”, produção independente com 44 páginas e apoio cultural de pessoas e entidades sediadas naquele município. Em 1998, exemplos da sua poesia sensível e comprometida com a Amazônia foram publicados na minhaAntologia Tocantina”, que me valeu sete anos de pesquisas sobre a produção literária em Marabá e teve patrocínio da Fundação Casa da Cultura.
Antônio Maranhão morreu aos 77 anos à noite de 37 de julho de 1998, em Belém, na Beneficência Portuguesa, onde esteve internado por 15 dias.
Uma amostra da sua verve:

Triste verdade

Andei muito chão
vi homens e mulheres sem trabalho,
ouvi velhos invocando a morte
e crianças abandonadas ao longo
de estradas riscando o sertão sem fim.
Vi cercas retilíneas, curvas, infinitas,
separando destinos.
E dominando a paisagem o verde da pastagem
Contrastando com a alvura do nelore no pastoreio.
Curiosamente, na vastidão das distâncias
Percorridas, não encontrei
- por incrível que pareça –
Um bezerro abandonado.
Meu Deus... Estamos entrando no 3º. milênio.

Círculo de giz
(Aos meu amigos mui amigos)

Não sou poeta.
Sou, simplesmente,
o menor filho de uma égua
que Deus, na sua teimosia,
jogou sobre a terra
para trotear, sem parar,
as estradas que nos prepararam
para pagar os meus pecados
e as infâmias de outros tantos
colocados no mesmo círculo de giz
que o destino me traçou.

Entre o ser e o não ser
recebo a minha sela
e disparo pelo mundo afora,
até que um anjo menos quadrado
tenha pena de mim.
Amém.

Aos meus heróis do Araguaia
(Ao Osvaldão, tão amado e desamado
Como convém a um guerrilheiro que se preza)


Companheiro:
segura a tua mão na minha mão
estende teu olhar inquieto
nas encostas da Serra das Andorinhas
e andemos lentos e compassados
pra que não quebremos
a quietude dos ermos capinzais
vazios de homens e esperanças!

Companheiro:
ajoelhemo-nos contritos
segurando ainda as nossas mãos
para que, balbuciando uma reza,
possamos escutar o lírico sermão
dos guerrilheiros que tombaram
acreditando na ressurreição dos campos
transformados em trigais imensos!

Companheiro:
levantemo-nos agora do chão morno
cheirando ainda a sangue e suor
e relembremos os predestinados campônios
abatidos na hora da fuga
sob o sibilar de chumbo e gritos
agourando o tempo e o futuro!

Companheiro:
rezemos em silêncio um salmo
que exista dentro de nós mesmos
para que não acordemos
os esquecidos heróis que repousam
no seio úmido da terra saqueada.

Companheiro:
na hora da nossa dádiva, ofertemos
para eles uma rosa vermelho
um verso bíblico de Jeremias
e as estrelas do céu
espelhadas nas águas do Araguaia.
(Xambioá, 03.10.91)

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